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Acordo entre o RN e a União pode destravar empréstimo de até R$ 855 milhões e empurra o problema fiscal para o próximo governo

A homologação pelo Supremo Tribunal Federal (STF) do acordo entre a União e o Rio Grande do Norte é, sem dúvida, um fato político e fiscal relevante para o próximo ano, mas quem  pagará a conta serão os funcionários públicos e o próximo governador do Estado. O pacto, relatado pelo ministro Cristiano Zanin, destrava R$ 855 milhões em garantias federais e abre espaço para novos empréstimos, mas também submete o estado a um regime de disciplinamento fiscal inédito, rigoroso e politicamente sensível.

Por trás da conciliação homologada pelo STF, o acordo confirma um diagnóstico conhecido, mas raramente assumido com tanta clareza: o RN não consegue fechar suas contas sem recorrer a endividamento e negociações excepcionais com a União. A homologação, de fato, resolve um entrave jurídico do Programa de Equilíbrio Fiscal (PEF), mas revela um estado que opera no limite da Lei de Responsabilidade Fiscal e depende de articulações extraordinárias para manter capacidade de investimento.

O compromisso imposto pelo artigo 167-A da Constituição — acionado quando as despesas correntes ultrapassam 95% da receita corrente líquida — funciona como uma camisa de força. Ele exige cortes de gastos, impede reajustes salariais, congela criação de estruturas administrativas e obriga redução de cargos comissionados caso o limite seja ultrapassado. Na prática, o RN passa a viver sob constante vigilância fiscal, com o STF e a Procuradoria-Geral da República acompanhando o cumprimento das metas quadrimestre a quadrimestre.

Para um estado que historicamente enfrenta pressões salariais, demandas de servidores, déficits previdenciários crescentes e rigidez orçamentária extrema, cumprir esses gatilhos não será trivial. O acordo, portanto, oferece oxigênio, mas cobra um preço: austeridade permanente.

Do ponto de vista político, o pacto também muda o tabuleiro. O governo estadual ganha fôlego para retomar investimentos em obras jusamente no ano eleitoral. Ao mesmo tempo, assume compromissos que limitam iniciativas populistas ou expansivas, o que deve gerar tensões com categorias organizadas.

Economicamente, a liberação da garantia federal é relevante: sem ela, o RN não teria como captar recursos no mercado com taxa aceitável. Mas ao amarrar o estado a metas rígidas, o acordo funciona, ao mesmo tempo, como um selo de confiança e um fiscal permanente. Garante empréstimos agora, mas impede flexibilidades futuras.

Também é preciso considerar o precedente nacional. Ao formalizar um “modelo de conciliação fiscal”, o STF se coloca como mediador de conflitos federativos e sinaliza que estados com dificuldades semelhantes poderão buscar solução semelhante. A União, por sua vez, reforça sua posição como fiadora e reguladora da disciplina fiscal dos entes subnacionais.

No caso do RN, os impactos reais do acordo dependerão menos da assinatura em si e mais da capacidade do governo de cumprir metas e, principalmente, de enfrentar o problema estrutural que há anos drena sua capacidade de investimento: alto gasto obrigatório, baixa elasticidade de receita e crescente despesa previdenciária.

Se o estado conseguir transformar os novos empréstimos em obras que gerem crescimento econômico e receita futura, o pacto poderá ser lembrado como ponto de virada. Se não, será apenas mais um episódio da longa dependência financeira do RN.

A homologação, portanto, é um alerta para o futuro governador ou governadora: sem reformas profundas, os R$ 855 milhões podem significar alívio momentâneo, mas não garantem sustentabilidade. 


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