A Prefeitura de Natal encaminhou à Câmara Municipal um projeto de lei que regulamenta a apresentação, execução e prestação de contas das emendas parlamentares impositivas. O texto chega em meio à repercussão do caso da vereadora Brisa Bracchi (PT), investigada pelo Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN) por destinar recursos de emenda a um evento de caráter político-partidário, que expôs a ausência de regras claras sobre o uso dessas verbas no município.
Desde o ano passado a Prefeitura havia feito um estudo para enviar um projeto regulamentando esse repasse, mas sempre houve uma resistência por parte dos vereadores, principalmente quanto a deixarem de indicar as atrações artísticas principal destino das emendas ao orçamento municipal.
Agora, com a repercussão do caso Brisa, o Ministério Público abriu um inquérito e solicitou da Prefeitura as regras que regulamentam o uso das emendas. Como na prática não existiam, o prefeito resolveu enviar esse projeto para a Câmara.
Pela proposta, as emendas terão uma reserva orçamentária de 2% da receita tributária arrecadada no exercício anterior, dividida de forma igualitária entre todos os vereadores. Do total, 50% deverão obrigatoriamente ser aplicados em ações e serviços de saúde, conforme determina a Constituição. Além disso, 70% das emendas (exceto as de saúde) deverão ser destinadas a despesas de capital, ou seja, investimentos em obras, equipamentos e infraestrutura, e não em custeio.
O projeto fixa ainda um limite de 20 emendas por vereador, com possibilidade de apresentar três suplementares para continuidade de obras em andamento. Também determina que as emendas sejam de execução obrigatória, salvo nos casos de impedimento técnico — como ausência de projeto, licença ambiental ou incompatibilidade com políticas públicas.
Para garantir transparência e controle, o texto prevê a criação de um sistema eletrônico de gestão das emendas, com rastreabilidade e divulgação pública de todas as etapas no Portal da Transparência. Cada emenda deverá ser executada por meio de conta bancária exclusiva, e o órgão responsável pela execução responderá solidariamente pela correta aplicação dos recursos. A proposta também cria um “Portfólio de Projetos do Município”, que reunirá iniciativas previamente avaliadas quanto à viabilidade técnica, ambiental e financeira, permitindo que os vereadores destinem recursos a ações já estruturadas pelo Executivo.
Outro ponto importante é a vedação de emendas com caráter político, partidário ou promocional. Fica proibida, por exemplo, a indicação de artistas ou fornecedores em eventos custeados com recursos públicos. Os eventos culturais, esportivos ou de lazer financiados por emenda deverão ter licenças em dia, identificação pública do uso de verba municipal e proibição de cobrança de ingressos. O projeto também inclui critérios de sustentabilidade, como gestão de resíduos e uso de materiais recicláveis.
O debate sobre o tema ganhou força depois que a vereadora Brisa Bracchi destinou R$ 18 mil de emenda para o evento “Rolê Vermelho – Bolsonaro na Cadeia”, realizado em agosto. O MPRN apura possível desvio de finalidade, uma vez que o repasse foi classificado como apoio a “festejos populares”. O caso gerou um processo também na Câmara Municipal, que aceitou a denúncia e deu início ao trâmite que pode levar à cassação da parlamentar.
Sem regulamentação municipal específica, a aplicação das emendas vinha sendo feita com base em orientações genéricas do orçamento e decisões internas da Prefeitura. Em 2025, levantamento apontou que 52% dos recursos das emendas impositivas foram destinados a eventos e festejos, o que acendeu o alerta de órgãos de controle.
Com o PL 171/2025, a Prefeitura busca sanar esse vazio normativo, garantindo segurança jurídica e alinhamento às decisões do Supremo Tribunal Federal.
Principais pontos do Projeto
Percentual e distribuição
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2% da receita tributária do ano anterior será destinado às emendas parlamentares.
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Cotas iguais para todos os vereadores.
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50% obrigatórios para ações de saúde.
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70% das demais emendas (fora da saúde) devem financiar investimentos — obras, equipamentos e infraestrutura.
Limites e execução
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Cada vereador poderá propor até 20 emendas, além de 3 suplementares para continuidade de obras.
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As emendas são de execução obrigatória, exceto em caso de impedimento técnico comprovado.
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Possibilidade de remanejamento das emendas enquanto o orçamento estiver em vigor.
Transparência e controle
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Criação de um Sistema Eletrônico de Gestão das Emendas, com rastreabilidade total.
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Divulgação obrigatória de todas as etapas no Portal da Transparência.
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Movimentação dos recursos em conta bancária exclusiva.
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Fiscalização sob responsabilidade conjunta da SEFIN, SEMPLA e Secretaria de Governo.
Parcerias com entidades (OSCs)
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Aplicação das regras da Lei nº 13.019/2014 (Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil).
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Dispensa de chamamento público quando a entidade for regular e indicada nominalmente.
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Exigência de plano de trabalho detalhado, prestação de contas e publicação no Diário Oficial.
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Entidades beneficiadas devem manter site próprio com relatórios de execução.
Emendas para eventos
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Permitidas somente para custeio do evento, sem indicação de artistas ou fornecedores.
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Exigência de licenças e alvarás prévios (bombeiros, ambientais etc.).
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Proibição de cobrança de ingressos em eventos financiados com verba pública.
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Obrigação de identificar publicamente o uso dos recursos de emenda.
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Estímulo à sustentabilidade: uso de materiais recicláveis, gestão de resíduos e eficiência energética.
Portfólio de Projetos do Município
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Cria um banco de projetos pré-avaliados pelo Executivo, com análise técnica, ambiental e financeira.
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Atualização anual, publicada antes do envio da Lei Orçamentária Anual (LOA).
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Facilita a destinação de recursos para ações prioritárias e estruturadas da cidade.