Você passaria perfume em um bebê de seis meses? Pintaria suas unhas minúsculas com esmalte que contém formaldeído? Passaria bronzer em suas bochechas?
Uma investigação do The New York Times revelou que bebês e crianças pequenas estão sendo rotineiramente expostos a produtos cosméticos voltados para adultos, como sprays perfumados, esmaltes e até tatuagens de henna preta.
Embora isso possa parecer inofensivo — ou até algo “Instagramável” — a ciência conta uma história mais preocupante. A pele dos bebês é biologicamente diferente da pele dos adultos: é mais fina, mais absorvente e ainda está em desenvolvimento.
A exposição a certos produtos pode causar problemas imediatos, como irritações ou reações alérgicas e, em alguns casos, pode representar riscos à saúde a longo prazo, como alterações hormonais.
Essa preocupação não é nova. Um estudo de 2019 mostrou que, a cada duas horas, uma criança era levada ao hospital nos EUA por exposição acidental a produtos cosméticos.
A pele do recém-nascido tem o mesmo número de camadas que a pele adulta, mas essas camadas são até 30% mais finas. Essa barreira mais delicada facilita a penetração de substâncias, inclusive químicas, nos tecidos mais profundos e na corrente sanguínea.
Além disso, a pele jovem tem maior teor de água e produz menos sebo (o óleo natural que protege e hidrata a pele). Isso a torna mais suscetível à perda de água, ao ressecamento e à irritação, especialmente quando exposta a fragrâncias ou cremes que não são formulados para bebês.
O microbioma da pele — uma camada protetora composta por microrganismos benéficos — também leva tempo para se desenvolver. Por volta dos três anos de idade, a pele da criança completa a formação de seu primeiro microbioma. Antes disso, os produtos aplicados podem desequilibrar essa camada delicada.
Na puberdade, a estrutura da pele e o microbioma mudam novamente, alterando a forma como ela reage aos produtos.
A investigação identificou o uso de bronzers e esmaltes em crianças pequenas. Esses produtos frequentemente contêm substâncias químicas nocivas, ou até cancerígenas, como formaldeído, tolueno e ftalato de dibutila.
O tolueno é um neurotóxico conhecido, e o ftalato de dibutila é um desregulador endócrino — substância que pode interferir na função hormonal, afetando potencialmente o crescimento, o desenvolvimento e a fertilidade. Ambas podem penetrar com mais facilidade pela pele fina e permeável dos bebês.
"Natural" não significa inofensivo
Produtos vendidos como “naturais” ou “seguros” também podem provocar reações alérgicas. A própolis (conhecida como “cola de abelha”), por exemplo, está presente em muitos cosméticos naturais, mas causa dermatite de contato em até 16% das crianças.
Um estudo identificou, em média, 4,5 alérgenos de contato por produto em linhas de cuidados naturais para a pele. Entre 1.651 produtos "naturais" no mercado dos Estados Unidos, apenas 96 (5,8%) estavam livres de alérgenos de contato.
Até mesmo alegações como “testado dermatologicamente” não garantem segurança: isso apenas indica que o produto foi testado sobre a pele, e não que está livre de substâncias alergênicas.
Bebês e crianças pequenas não são adultos em miniatura. A pele deles ainda está em desenvolvimento e é mais vulnerável a irritações, à absorção de substâncias químicas e aos efeitos sistêmicos — ou seja, substâncias que penetram pela pele podem alcançar a corrente sanguínea e afetar órgãos e sistemas do corpo.
Por isso, o uso de produtos voltados ao público adulto — ou mesmo alternativas “naturais”, ainda que bem-intencionadas — pode acarretar riscos reais.
Reações adversas podem surgir como vermelhidão, descamação ou coceira e, em casos mais graves, bolhas ou crostas. Sintomas respiratórios, como tosse ou chiado, devem sempre ser avaliados por um profissional de saúde.
Na dúvida, o melhor é manter a simplicidade. Limite ao máximo o que é aplicado na pele do seu filho, especialmente nos primeiros anos de vida.