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Devo não nego, vou ver quando pago

A Prefeitura do Natal, através da Funcarte, anunciou que deu início aos pagamentos relativos ao carnaval 2025, poucos dias após o fim da festa.  Serão pagos nessa etapa, todos os artistas locais; as orquestras de frevo cadastradas por Edital; as premiações das Escolas de Samba, juntamente com as respectivas ajudas de custo das 12 agremiações que desfilaram na Av. Duque de Caxias; as ajudas de custo das tribos indígenas; e todos os profissionais que prestaram  serviços no carnaval, como comissões julgadoras, engenheiros, carregadores, locutores, produtores e demais serviços vinculados ao evento.

O anúncio chamou a atenção diante da tão propalada dívida da Funcarte anunciada desde o ano passado que, quando o ex-secretário Dácio Galvão pediu exoneração do cargo, estaria em torno de R$ 25 milhões. Em meados do ano passado, a vereadora Brisa Bracchi chegou a acionar o Ministério Público para que o MP cobrasse a dívida do município com os artistas. Depois disso, ainda foi realizado o Natal em Natal e outros eventos menores, embora seja claro uma parte da dívida foi paga.

Na verdade, o que a Funcarte está fazendo é pagar as despesas autorizadas no mandato do prefeito Paulo Freire e deixar os débitos que encontrou do ex-prefeito Álvaro Dias pendurados, sem perspectiva concreta de pagamento.

Essa postura, no entanto, fere a legislação que determina o pagamento de débitos de acordo com a Ordem Cronológica. Pela lei 8.666, os pagamentos aos credores públicos devem ser feitos por ordem de apresentação da documentação. Cada secretaria ou órgão público precisa fazer sua lista de pagamento de acordo com a liquidação da despesa, que é quando um funcionário atesta que o serviço foi prestado ou o produto entregue. A partir daí, o credor entra numa fila para pagamento que só pode ser quebrada com uma justificativa expressa do gestor do órgão e publicada no Diário Oficial.

A Prefeitura admite que não esteja pagando os Restos a Pagar em relação às despesas da Funcarte e disse ao blog que “o início do pagamento pelos serviços prestados à Prefeitura, referentes ao Carnaval 2025, obedece à ordem cronológica do atual exercício financeiro. Medida que não fere a ordem de pagamentos. Os valores inscritos em restos a pagar referente aos exercícios anteriores continuarão seguindo o trâmite que lhes é cabível, conforme disponibilidades orçamentária e financeira do Município”.

Não tem sido esse o entendimento dos Tribunais de Contas.

Um advogado especialista na área contesta essa interpretação. “A alegação de falta de recursos, comum em época de transição de poder, é inadmissível como única justificativa para a quebra da Ordem Cronológica de Pagamentos, especialmente porque a dívida pertence ao Município e não ao gestor”, diz, lembrando que se não fosse essa a interpretação um gestor que recebe a administração de um antecessor adversário poderia simplesmente não pagar os débitos encontrados.

Ele lembra que o art. 5º, da Lei nº 8.666/93 prevê que o pagamento das obrigações deve seguir a "estrita ordem cronológica das datas de suas exigibilidades, ou seja, da data da liquidação da despesa ou daquela prevista em contrato

O artigo 3º da Resolução 011/2024 do TCE/RN determina que a ordem cronológica de exigibilidade terá como marco inicial, para efeito de inclusão do crédito na seqüência de pagamentos, a liquidação de despesa, que é quando se dá “a verificação do direito adquirido pelo credor, tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito, após a execução do objeto ou de etapa do cronograma físico-financeiro do contrato, conforme o caso”

O parágrafo 4º da Resolução estabelece que “as despesas inscritas como restos a pagar processados, observada a estrita ordem cronológica dos seus correspondentes atestos, terão prioridade de pagamento sobre as que venham ser liquidadas no decorrer do exercício seguinte à efetiva inscrição”.

E no parágrafo seguinte ainda deixa claro que “as despesas inscritas como restos a pagar não processados terão como marco inicial para observância da ordem cronológica de pagamento a sua efetiva liquidação, que, nos termos da presente Resolução, corresponderá à data da emissão do seu respectivo atesto e que a alteração da ordem cronológica de pagamento somente ocorrerá mediante prévia justificativa da autoridade competente, devidamente publicada na imprensa oficial, e posterior comunicação ao órgão de controle interno da Administração e ao TCE-RN.

Na própria Resolução está prevista a sanção em caso de descumprimento: 

A inobservância ao disposto nesta Resolução sujeita os responsáveis às sanções previstas em lei.

Parágrafo único. Havendo preterição indevida da ordem cronológica de exigibilidade, o agente responsável pelo pagamento poderá incorrer nas penas do art. 337-H do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940.

Ou seja, pena de reclusão, de 4 (quatro) anos a 8 (oito) anos, e multa.  


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